quarta-feira, 19 de junho de 2013

Quando o assunto é ética e moral geralmente pensa-se que é quase algo indiscutível de se tratar, pois é algo muito relativo a valores e a própria cultura, mas esse é um erro que geralmente alcançamos pois não distinguimos bem oque seria ética de moral. Bom, muitas vezes os dois são usados como sinônimos, mas quando fazemos a distinção de um do outro é necessário que saibamos bem qual dos dois estaríamos tratando. Ética e Moral são, sim, discutíveis, mas diferentemente da Ética, que tem uma característica universalista, a Moral possui uma face um pouco mais relativista.
O termo Moral é cunhado por muitos autores como algo que condiz com um conjunto de crenças sobre aquilo que é tido como certo e errado dentro de uma sociedade formando um conjunto de normas abstratas não concretizadas em como uma lei concreta como conhecemos,mas uma norma interna que age de forma dogmática. Esta apenas estabelece esse conjunto de crenças e normas como algo já dado, não oferecendo ferramentas para que se pense como tais conceitos foram tomados. Ética, quando distinguido da Moral, tem um lado mais filosófico, reflexivo, pois é o ato de se pensar e discriminar o certo do errado de forma racional,criando uma estrutura que adota princípios e pressupostos que servem para refletir qual a ação que deve ser tomada e também como pensamos este ato, como definimos oque é certo ou errado. Seu produto são argumentos que tratem de ações e as tentam afirmar, racionalmente, como ética ou anti-ética.
Como já dito, a Moral é tido como relativizada em relação a ética ,pois a maioria de suas normas baseiam-se em crenças factuais. Já a Ética possuir essa faceta reflexiva racional, podemos entender que esta é algo que tende colocar-se como universal (e pretende, pois para que haja debate, deve ser algo qual possa ser tratado por todos de forma igual), pois a racionalidade, como apenas um principio formal, não se trata de nenhum conteúdo, mas é apenas a estruturação de pensamentos, quais não se contradigam, sendo apenas um ato reflexivo do pensamento humano, qual se acredita que seja igual a todo homem, sã de suas faculdade teleológicas, pelo fato de qualquer homem em qualquer tempo ou lugar do mundo é capaz de chegar na mesma solução através da lógica se este se utiliza das mesmas premissas.
Podemos então, em todo caso, utilizarmos Ética e Moral como sinônimos, pois estes, mesmo apresentando divergências em seus conceitos, possuem características convergentes e ao entrar-se na discussão sobre a definição concreta distinta de Ética e Moral, acaba-se por confundir as duas, fazendo assim que muitos autores tratem o debate ético como o debate moral.
Bom, primeiramente se pretendemos tratar de Ética e Moral precisamos lembrar que muitos outros autores anteriores ocuparam-se de tratar de tais problemas e em sua busca por resposta, acabaram por criar sistemas formais de pensamento, com premissas, suposições diferentes, produzindo assim epistemes muito diferentes de pensamento, cada logica seguindo suas bases. Um destes autores foi Immanuel Kant, filósofo alemão que revolucionou não somente a forma de se pensar em ética como também toda a própria filosofia. Kant escreveu em 1781, a "Crítica da Razão Pura" que ficou conhecido como sua maior obra, qual apresenta aspectos metafísicos qual dão embasamento para seu pensamento moral qual é mostrado em "Fundamentos da Metafisica dos Costumes". Para podemos apresentar a teoria ética de Kant, primeiramente introduziremos levemente a metafisica kantiana para que possa-se fundamentar as bases do pensamento qual Kant se utiliza para escrever "Fundamentação da Metafisica dos Costumes".
Para Kant, a compreensão e o conhecimento humano (como de todo ser racional) dividi-se em um conhecimento inteligível e a priori, qual ele identifica como Razão Pura e no conhecimento que advêm do mundo exterior em forma de sensações, tido como Razão Especulativa. Em "Crítica da Razão Pura" Kant estabelece os objetos e a forma de cada uma dessas razões, sendo a razão especulativa limitada ao conhecimento dos fenômenos empíricos, quais se apresentam através das vias empíricas, dado pelo mundo exterior e não afetado pela nossa consciência ou razão, sendo obtido conhecimento apenas após a experiencia do mesmo. Para Kant, não seria possível conhecer as coisas em si através apenas da experiencia e tudo aquilo que estaríamos vendo seriam as formas quais as coisas se apresentam para nós como fenômenos, ou seja, não conhecemos os conceitos e ideais destas coisas, apenas as formas quais são apresentadas a nós pelas sensações, moldando-se em nossas formas de espaço e tempo (quais seriam apriorísticos). Mas reconhecemos as coisas através do mundo sensível por meio de nossas experiencias, não como coisas em si, mas como fenômenos dos mesmo, então como poderíamos pensar coisas quais não se apresentam para nós através da experiencia, pois essas não são passiveis de serem vistas, cheiradas ou tocadas? Como poderíamos pensar em coisas que existem por si só como conceitos puros como a liberdade? Estes seriam então os objetos da Razão pura, que tem como objeto tudo aquilo que não nos é apresentado pelas vias sensíveis, sendo este um conhecimento puro, a priori. E mesmo que que não possamos conhecer essas coisas em si, por não podermos testa-las no mundo físico através da experiencia, podemos (e devemos) pensa-las como conceito, como coisas em si mesmas e presumi-las, desde que não nos contrariemos ao pensa-las.
As relações entre os objetos da Razão Especulativa e da Razão Pura devem-se manterem separados, pois os princípios quais devemos sujeitar um não sujeitará o outro. Por exemplo, podemos sujeitar os objetos da Razão Especulativa a lei da causalidade, pois esses se relacionam sobre leis universais de causa e efeito, onde todo efeito provem de uma causa e vice-versa, mas podemos sujeitar os objetos da Razão Pura a esta mesma lei, pois logo entraríamos em contradição, como no caso da alma e da liberdade, que nos é apresentado como a segunda antinomia de Kant. Ao aplicar a lei de causa e efeito na alma e na liberdade, quais são um objeto da razão pura e não estão sujeitos a interferências do mundo exterior e pressuponho que a alma é livre, logo entraria em contradição, pois eu consigo pensar a liberdade e a penso como coisa em si, mas se sujeito a alma a razões de causa e efeito, não conseguiria eu então presumir a liberdade da alma, pois esta estaria presa em uma relação de causa e efeito, qual não nos permite pensar a liberdade, que também por si não pode-se sujeitar a causalidade.
Você deve estar pensando oque isso tem em relação com a teoria ética kantiana, não? Bom, explanamos esses conceitos para poder dizer a você que a ética, como é tida para Kant é pertencente a Razão pura e se não fossemos capazes de pensar as coisas por si só e presumir as mesmas, não teríamos a liberdade, qual é um princípio da Ética. Não é possível ter-se ética ou moral sem liberdade.
Entramos agora no campo ético da discussão filosófica. Vemos então que o homem possui razões pertencentes a dois mundos distintos, o mundo do sensível empírico ( o mundo exterior) e do inteligível e imaterial. Neste mundo físico e sensível o homem apresenta seu lado irracional, ou seja, seu lado das paixões, da vontade e da necessidade, nesse mundo não há, de fato, a liberdade. A liberdade do homem está em, através da racionalidade da razão pura prática, que pode pensar as coisas em si sem sujeitar-se as causas da Razão Especulativa, esse é capaz de criar leis morais, pensando aquilo que é o DEVER. A liberdade humana esta no fator deste poder racionalmente ditar valores, incondicionais e independentes, e impor sobre si essas leis que são expressão da racionalidade em nós, manifestação da ética e humanidade, como de nossa liberdade de sujeitarnos a nossa moralidade, escapando da causa e efeito. Sujeitar-se a este DEVER é obedecer a si mesmo, por consequente ser livre.
Para que possamos agir moralmente devemos cunhar nossas ações apenas pela obediência ao Dever e se tomamos atitudes por algum motivo alem deste, mesmo que em concordância com aquilo que é o dever, estaremos agindo de forma imoral. Aquele que age apenas pela obediência ao dever moral é aquele que age moralmente. Fatores externos de nossa natureza nos levam a agir por interesse e este não é incondicionado pois é uma forma de consequência e egoísta quenos leva a usar pessoas como meios para o que possamos alcançar oque desejamos.Este dever é conhecido como "Imperativo Categórico" pois não se sujeita a nada e é definido apenas pela razão, afirmando-se de forma imperativa, "faço isso", "faça aquilo" e não "faço isso se..." ou "faça isso para". Kant estabelece três máximas para que guiem esse imperativo categórico e coloca que se nossas ações vão contrarias as máximas estas estarão sendo imorais. As máximas são:
1. Age como se a máxima de tua ação devesse ser erigida por tua vontade em lei universal da Natureza;
2. Age de tal maneira que trates a humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa de outrem, sempre como um fim e nunca como um meio;
3. Age como se a máxima de tua ação devesse servir de lei universal para todos os seres racionais.

Francisco Vasconcelos

sábado, 15 de junho de 2013

Videos de repressão policial em manifestações recentes


Em São Paulo, no 4º Ato contra aumento da tarifa


                                       Na Turquia, durante o protesto contra o Primeiro Ministro

segunda-feira, 10 de junho de 2013

Reflexões acerca da violência em geral e da violência policial

 Reflexões acerca da violência em geral e da violência policial

Por Bruno Euzébio Cont 
A moral, por mais que possa ser discutida em termos racionais, de qualquer forma diz respeito à prática de ações. Por esse motivo, a escolha de uma situação-problema para fazer uma análise sobre o que está de acordo ou em desacordo com nossa moralidade parece ser um caminho seguro. 
Entretanto, utilizando-se do mesmo raciocínio empregado por Kant relativo a exposição de exemplos morais, o qual diz que para se dar um exemplo sobre o que é certo ou errado, antes de expô-lo, é necessário um exame racional por parte de quem o propõe, procederemos da mesma forma com o objetivo de ter clareza sobre o tema da violência policial. Vale aqui ressaltar que, procedendo desse modo, partindo do racional para depois atingir o real, a reflexão se dará restritamente acerca da violência, não importando se ela é policial, sexual, ou de qualquer tipo, pois essas características são contingentes, indicativas de como a violência em si é algo que ocorre de diversas formas. O fato de o tema escolhido ter sido a violência policial é apenas uma questão de gosto, e o método aqui empregado para tratar dela poderia ser aplicado a outros tipos de violência. Dito tudo isso, prossigamos com nossa reflexão que será direcionada primeiramente a violência em si, de forma filosófica, para depois tratarmos da violência policial.


         A violência é uma ação e, como tal, necessita de um agente. Mas essa ação possui a peculiaridade (na  o exclusividade), de ter um receptor. Daqui concluímos que para haver violência é necessário, ao menos, dois agentes capazes de agir e sentir. Dizer isso é o mesmo que afirmar que ela tão-somente deve ocorrer em organismos vivos, pois jamais podemos conceber que dois objetos inanimados tenham a capacidade de agir sobre o outro com o objetivo de ser violento. Mas como há relação de ação e reação também entre objetos inanimados, como a água e o sal que, quando misturados, faz com que a água sinta a influência do sal, tornando-se salgada, assim como o sal também sente a água, desconcentrando-se, é necessário algo mais do que a relação de ação e reação entre dois agentes para se compreender a violência.

         A noção de intenção, apesar de insuficiente, é fundamente para nosso propósito, pois a nenhum objeto inanimado, a despeito das infinitas causas que o levem a agir sobre outro, pode ser atribuído qualquer grau de intenção. Além disso, é algo apenas encontrado nos homens, sendo ausente nos demais animais, dado que o motor de ação destes é o instinto, não a racionalidade. Por exemplo: Quando dois animais brigam entre si, por mais que o objetivo de fato seja ferir o oponente, este objetivo, assim como outros, visa a um único e determinado fim que é a sobrevivência. Além disso, o oponente ferido, sendo animal, não tem a faculdade de julgar para considerar violenta a ação do vencedor. Mas isso não justificaria uma ação violenta contra qualquer animal, pois eles são dotados de sensibilidade e, por conseguinte de repulsa. Logo, os animais não são capazes de saber de fato o que é e o que não é violento, mas podem sentir a violência.
         Voltemos ao homem. Sabendo que este é dotado de intenções e, por isso, o único ser capaz de agir por violência (o destaque é para ressaltar que, além das intenções, o homem é o único ser conhecido capaz de estabelecer objetivos), resta verificar até que ponto a intenção é definitiva na violência.

         Lembrando que a violência, além de ser uma ação, precisa de no mínimo dois agentes, um ativo e outro reativo, é evidente que a intenção possui sua importância, mas seu escopo de atuação é limitado. Isso ocorre porque a intenção e a ação pertencem a domínios diferentes, sendo aquela racional e esta, empírica. Se direcionarmos nossa atenção para as ações, veremos que todas elas envolvem, em algum momento antes de sua execução, uma tomada de decisão. O grau de importância dessa tomada de decisões depende diretamente da ação a ser executada, pois não se pode dizer que decidir levantar  de uma cadeira e dar alguns passos demande o mesmo grau de reflexão que devemos empregar antes de votar num candidato à presidência da república. Além disso, o fato de nossas decisões, por conseguinte nossas intenções, terem um componente racional cujo grau pode variar de acordo com a situação, enquanto a execução das ações é empírica, faz com que tenhamos certo controle apenas daquelas. Isso ocorre porque o que é racional ocorre apenas dentro de nós, nos garantindo controle. As ações, sendo exteriores ao eu, nos garantem apenas o controle das iniciativas e das formas de agir, ao passo que o resultado dessas ações é sempre incerto, não conseguimos controla-los. Isso implica que uma intenção violenta não necessariamente gerará uma ação violenta, ao passo que uma intenção não violenta pode gerar uma ação violenta.

         Sendo a violência um agir em relação ao outro, ela é um todo que compõe intenções do agente e resultado de ação verificáveis no receptor. Sendo o receptor racional, ou seja, homem, além de sensível, é também capaz de fazer julgamentos, ou seja, avaliar intenções. Graças a essa faculdade, ele é capaz de especular a respeito das intenções de outra pessoa e, por conseguinte, o objetivo dessas intenções. Logo, para o homem, uma ação com consequências violentas é considerada ainda mais violenta se for identificada a violência na intenção do agente. Isso é verificável na forma como os crimes violentos são punidos no Brasil. É inegável que o homicídio é uma ação com consequências violentas, sendo um dos motivos de ser punível. Mas o determinante para considerar a culpabilidade de quem o comete é justamente a intenção do agente. Daí a distinção entre homicídio culposo e doloso, este último punível com maior rigor.

         Feita essa reflexão acerca da violência, passemos a parte contingente, ou seja, um dos tipos de violência que é a policial.
         A polícia é o representante personificado da definição weberiana de estado como conjunto de instituições detentoras do monopólio do uso legítimo da força. Sendo a polícia uma instituição, suas ações têm muito haver com o estado ao qual ela serve, tanto nas suas intenções, como nas suas ações. Isso implica que numa ação policial não deve ser avaliada apenas a conduta do oficial que a executa, mas também a do governo que está conduzindo o estado, ou seja, as instituições. Por esse motivo é difícil definir a culpabilidade numa ação policial considerada violenta, já que para fazer isso é imperativo questionar se o oficial, no momento da ação, utilizou-se de sua intenção, ou se estava seguindo ordens. Esse questionamento, de alguma forma, também ocorre com quem sofre a violência, mesmo que a pessoa, de forma legítima, tenda a ter maior repulsa contra o oficial por ele ser o meio a partir do qual ocorre a violência. Posto o que foi dito, se a ação violenta é fruto da obediência a ordens, a violência não é mais policial, mas estatal. Sendo assim, adotaremos a definição de violência policial como aquela cometida por intenção do oficial.

         Dentre as atribuições da polícia, uma delas é garantir o bem-estar de quem faz parte do estado ao qual ela está subordinada. Para cumprir bem essa função, um oficial deve ser bem pago, treinado e constantemente avaliado, pois não é simples garantir o bem-estar das pessoas. Mas isso não é suficiente. Se alguém detém o uso de força letal, é necessário que se tenha boas intenções, ou em caso negativo, que não as execute. Isso gera ao policial a responsabilidade de ser calmo no exercício de sua profissão. Além disso, voltando a atenção para a população em geral, esta tem todo o direito de não gostar da polícia, pois é impossível fazer alguém gostar de algo por obrigação. Seria ideal que todos respeitassem a polícia, apesar de isso não ocorrer com uma boa frequência. Mas saindo do âmbito do que deve e do que deve não ser, o qual não corresponde a realidade de fato, resta saber o que a violência policial tem de específico em relação a outros tipos de violência.
         A especificidade do mal agir de um policial está justamente no fato de, mais do que ser repulsivo, ser contrário ao que ele deve fazer como agente do estado que prima pelo bem-estar da sociedade, sendo a garantia dessa paz social justamente o monopólio dos meios que poderiam ser usados para acabar com ela. Por esse motivo um homicídio cometido por um policial deve ser considerado mais grave do que se cometido por um cidadão comum, já que a este não foram atribuídas as funções de garantia do bem-estar, ao passo que àquele, de posse de tais garantias, fez mal uso delas. O policial comete dois atos imorais. Um é o crime, o outra é a escolha pelo mal uso do poder legítimo de aplicar a violência.


         Concluindo, a violência policial é uma imoralidade que se destaca das demais pois, no momento de tomada da decisão que precede o ato violento (aqui tratamos o ato violento unicamente quando precedido por uma má intenção, apesar de, conforme exposto anteriormente, poder ocorrer sem haver uma intenção violenta) outro ato violento ocorre, que é escolher utilizar de forma errada uma atribuição institucional. Esse mesmo raciocínio poderia ser aplicado a outros crimes cometidos por agentes dotados de prerrogativas institucionais, como a corrupção, já que além do crime, há mal uso delas. Logo, a especificidade da violência policial, assim como outras violências realizadas por agentes a serviço do estado, reside na peculiaridade de uma má intenção necessariamente anteceder não apenas uma, mas duas ações violentas. Isso não é apenas grave. Isso é imoral.